O Brasil é responsável por uma das mais
altas taxas de reincidência criminal em todo o mundo. No país a taxa
média de reincidência (amplamente admitida mas nunca comprovada
empiricamente) é de mais ou menos 70%, ou seja, 7 em cada 10 criminosos
voltam a cometer algum tipo de crime após saírem da cadeia.
Alguns perguntariam “Por quê?”. E eu
pergunto: “Por que não”? O que esperar de um sistema que propõe
reabilitar e reinserir aqueles que cometerem algum tipo de crime, mas
nada oferece para que essa situação realmente aconteça. Presídios em
estado de depredação total (veja teoria das janelas partidas),
pouquíssimos programas educacionais e laborais para os detentos,
praticamente nenhum incentivo cultural, e, ainda, uma sinistra cultura
(mas que divertem muitas pessoas) de que bandido bom é bandido morto (a
vingança é uma festa, dizia Nietzsche).
Situação contrária é encontrada na
Noruega. Considerada pela ONU, em 2012, o melhor país para se viver (1º
no ranking do IDH) e de acordo com levantamento feito pelo Instituto
Avante Brasil, o 8º país com a menor taxa de homicídios no mundo, lá o
sistema carcerário chega a reabilitar 80% dos criminosos, ou seja,
apenas 2 em cada 10 presos voltam a cometer crimes; é uma das menores
taxas de reincidência do mundo. Em uma prisão em Bastoy, chamada de ilha
paradisíaca, essa reincidência é de cerca de 16% entre os homicidas,
estupradores e traficantes que por ali passaram. Os EUA chegam a
registrar 60% de reincidência e o Reino Unido, 50%. A média europeia é
50%.
A Noruega associa as baixas taxas de
reincidência ao fato de ter seu sistema penal pautado na reabilitação e
não na punição por vingança ou retaliação do criminoso. A reabilitação,
nesse caso, não é uma opção, ela é obrigatória. Dessa forma, qualquer
criminoso poderá ser condenado à pena máxima prevista pela legislação do
país (21 anos), e, se o indivíduo não comprovar estar totalmente
reabilitado para o convívio social, a pena será prorrogada, em mais 5
anos, até que sua reintegração seja comprovada.
No presídio, um prédio, em meio a uma
floresta, decorado com grafites e quadros nos corredores, e na qual as
celas não possuem grades, mas sim uma boa cama, banheiro com vaso
sanitário, chuveiro, toalhas brancas e porta, televisão de tela plana,
mesa, cadeira e armário, quadro para afixar papéis e fotos, além de
geladeiras. Encontra-se lá uma ampla biblioteca, ginásio de esportes,
campo de futebol, chalés para os presos receberem os familiares, estúdio
de gravação de música e oficinas de trabalho. Nessas oficinas são
oferecidos cursos de formação profissional, cursos educacionais e o trabalhador recebe uma pequena remuneração. Para controlar o ócio, oferecer muitas atividades educacionais, de trabalho e lazer são as estratégias.
A prisão é construída em blocos de oito
celas cada (alguns deles, como estupradores e pedófilos ficam em blocos
separados). Cada bloco contém uma cozinha, comida fornecida pela prisão
e preparada pelos próprios presos. Cada bloco tem sua cozinha. A comida
é fornecida pela prisão, mas é preparada pelos próprios detentos, que
podem comprar alimentos no mercado interno para abastecer seus
refrigeradores.
Todos os responsáveis pelo cuidado dos
detentos devem passar por no mínimo dois anos de preparação para o
cargo, em um curso superior, tendo como obrigação fundamental mostrar
respeito a todos que ali estão. Partem do pressuposto que ao mostrarem
respeito, os outros também aprenderão a respeitar.
A diferença entre o sistema de execução
penal norueguês em relação ao sistema da maioria dos países, como o
brasileiro, americano, inglês é que ele é fundamentado na ideia que a
prisão é a privação da liberdade, e pautado na reabilitação e não no
tratamento cruel e na vingança.
O detento, nesse modelo, é obrigado a
mostrar progressos educacionais, laborais e comportamentais, e, dessa
forma, provar que pode ter o direito de exercer sua liberdade novamente
junto a sociedade.
A diferença entre os dois países
(Noruega e Brasil) é a seguinte: enquanto lá os presos saem e
praticamente não cometem crimes, respeitando a população, aqui os presos
saem roubando e matando pessoas. Mas essas são consequências
aparentemente colaterais, porque a população manifesta muito mais prazer
no massacre contra o preso produzido dentro dos presídios (a vingança é
uma festa, dizia Nietzsche).
LUIZ FLÁVIO GOMES, jurista, diretor-presidente do Instituto Avante Brasil
** Colaborou Flávia Mestriner Botelho, socióloga e pesquisadora do Instituto Avante Brasil.
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