1-
FURTO (art. 155, CP):
a) Conceito:
é a subtração, para si ou para outrem, de coisa alheia móvel.
b) Bem
Jurídico Tutelado: tutela o patrimônio (propriedade e posse) da coisa móvel.
OBS:
Não podem ser objeto de furto: ser humano, cadáver
(exceto se for propriedade científica de alguém ou instituição); coisas que
pertencem ao cadáver enterrado: violação de sepultura (art. 210 CP); coisas que
não pertencem a ninguém: res nullius – coisas que nunca
tiveram dono; res derelicta - coisa que já pertenceu a alguém, mas foi
abandonada pelo dono e res commune omnium – coisas de uso
comum (sol, água, rios, etc..). Direitos reais ou pessoais também não podem ser
objeto de furto, mas os títulos e documentos que os representam podem.
OBS:
A res
deperdita pode ser objeto de apropriação de coisa achada (art. 169, §
único, II, CP), pois a propriedade ou posse da coisa não foi renunciada.
c) Tipo
Objetivo: “subtrair”: tirar, retirar de outrem bem móvel sem a sua permissão
(sem o consentimento), com o fim de assenhoramento definitivo (animus rem sibi habendi).
“coisa”: toda substância corpórea,
material e suscetível de apropriação.
“móvel”: é tudo aquilo que
pode ser transportado de um local para o outro, incluindo os animais e
semoventes (abigeato). Os imóveis só poderão ser objeto de furto se forem
mobilizados. Extração mineral em terras alheias também é furto.
OBS:
Furto de Energia Elétrica: Art. 155, § 3º CP – equiparação da coisa móvel à
energia elétrica e outras formas de energia que tenham valor econômico. Exs:
gatos, gambiarras, furto de sêmem, tv a cabo, pulso telefônico, etc..
“alheia”: é o patrimônio que está na
posse ou propriedade de outrem.
OBS:
Há necessidade de ocorrência de dano patrimonial (crime material) para a
vítima, não importando apenas valor monetário, mas precisa ter alguma utilidade
para a vítima.
OBS:
É desnecessária a motivação para configurar o furto, bastando o animus de
assenhoramento definitivo da coisa.
d) Sujeito Ativo:
qualquer pessoa pode ser autor. Exceto: o proprietário, o sócio, o coerdeiro e
o condômino.
e) Sujeito Passivo:
qualquer pessoa, física ou jurídica, que tem posse ou propriedade do bem.
f) Elemento subjetivo:
dolo de subtrair a coisa de forma definitiva, para si ou para outrem (animus furandi ou animus rem sibi habendi).
A subtração para o simples uso transitório com a devolução da coisa em seu
estado perfeito é fato atípico.
OBS:
Se o agente, por erro, se apodera de objeto alheio, supondo lhe pertencer,
exclui-se o dolo e, portanto, o crime de furto.
OBS:
A coisa alheia móvel precisa ser retirada da esfera de vigilância do dono para
caracterizar o furto. Basta que o agente tenha recebido o bem em determinado
local e que não tenha obtido autorização para sair com ele, não havendo
necessidade que a vítima esteja olhando para o bem. Ex: se a própria vítima entrega o bem ao
agente, mas não autoriza que ele deixe o local em sua posse, porém ele,
sorrateiramente ou mediante fuga, tira o bem dali, o crime é de furto.
OBS:
Quando a posse é desvigiada e há quebra de confiança o crime será de
apropriação indébita, pois a vítima entrega o bem ao agente e autoriza que ele
deixe o local em sua posse, acreditando na boa-fé. A perda do bem sedá pela
falta de restituição. Ex: a vítima empresta um livro ao agente que nunca mais o
devolve; motoboy que fica com a entrega, etc..
POSSE
VIGIADA -------------------------------FURTO (155, CP)
(sem
autorização de saída com a coisa)
POSSE
DESVIGIADA -------------------------APROPRIAÇÃO INDÉBITA (168, CP)
(com
autorização de saída com a coisa)
g)
Consumação:
com
a retirada da coisa da esfera de disponibilidade da vítima, assegurando-se a
posse tranquila, mesmo que passageira, por parte do agente (inversão da posse).
h)
Tentativa:
sempre
que a atividade executória seja interrompida por causas estranhas à vontade do
agente e que impeça a posse tranquila da coisa pelo agente. Ex: Vítima que
percebe a ação de punguista e sai em perseguição, prendendo-o em seguida com a
coisa.
OBS:
Não há tentativa quando o agente introduza
mão no bolso da vítima e não encontra nada e a vítima não tem nenhum
dinheiro consigo, é crime impossível (impropriedade absoluta do objeto) art, 17
CP. Entretanto, se a vítima tem dinheiro em outro bolso, o seu patrimônio corre
risco e há tentativa.
i)
Furto
famélico ou necessitado: é aquele cometido por quem está
com em situação de extrema miserabilidade e necessita do alimento para saciar
sua fome e de sua família. Exclui-se o crime pelo estado de necessidade.
j)
Formas
de furto:
j.1)
Art. 155, § 1º: Furto noturno - é causa especial de aumento de pena quando o
crime for praticado durante o repouso noturno. Repouso noturno: é o período,
que se modifica conforme os costumes locais (análise judicial do caso
concreto), durante o qual as pessoas dormem. Essa majorante não se aplica ao
furto qualificado.
OBS:
Lugar habitado e com moradores em
repouso: entendimento dos TJS.
Lugar
desabitado: STJ e STF entendem que não há necessidade de habitação, basta
que esteja diante do período de repouso (STJ, 6ª T., Resp 75011/97/SP e STF, RT
600/459).
j.2)
Art. 155, § 2º: Furto de pequeno valor
ou furto privilegiado -
*
Réu primário;
*
Pequeno valor da coisa subtraída (até 1 salário mínimo vigente à época do
crime), independente do pequeno prejuízo causado à vítima;
*
O juiz deve, se preenchidos os requisitos, (direito subjetivo do réu)
substituir a pena de reclusão por detenção; diminuir a PPL de 1/3 a 2/3 ou
aplicar somente a pena de multa. Poderá cumular as duas primeiras alternativas.
OBS:
Não se aplica a privilegiadora aos furtos qualificados segundo uma corrente do
STJ, mas outra corrente vem ganhando força no sentido contrário.
OBS:
A privilegiadora aplica-se ao furto simples (155, caput) e ao furto noturno.
OBS: Furto privilegiado ≠ Furto de
bagatela: O furto de bagatela decorre do Princípio da
Intervenção mínima e ocorre quando a lesão ao bem jurídico tutelado é
irrisória, sendo fato atípico. Ex: furto de 1 rosa, furto de uma cebola, de 1
doce, etc... A jurisprudência tem abrangido como insignificante os furtos que
não ultrapassem 20 % do salário mínimo vigente, sendo que os maus antecedentes
ou reincidência não impediria a bagatela, mas tão somente a forma de agir
(violação de domicílio ou arrombamento) STF, RE 514531/RS..
k) Furto Qualificado – Art. 155, § 4º
e 5 º CP: Se o juiz reconhecer duas ou mais qualificadoras, a
primeira servirá para qualificar o crime e as demais como circunstâncias do
art. 59 CP (pena acima do mínimo);
I-
Rompimento
ou destruição de obstáculo: é violência contra
obstáculo que dificulte a subtração da coisa. Destruir: desfazer. Romper:
abrir.
· Momento do emprego da violência:
em qualquer momento durante a execução, ou seja, a violência precisa ser meio
para subtrair, pois se for após a consumação será furto simples + dano.
· Obstáculo:
é aquele destinado a proteger, exclusivamente ou não, a propriedade: janelas,
portas, fechaduras, alarmes, portões automáticos, etc.. Quando há a destruição da própria coisa não
incide a qualificadora: forçar ou quebrar o quebra-vento, romper fios elétricos
de veículos. No entanto, se quebrar o vidro do veículo para furtar objetos
dentre deste, incide a qualificadora, pois se considera obstáculo exterior à
coisa.
· Exame pericial:
é indispensável para comprovar a destruição ou rompimento. Há jurisprudência
admitindo a prova testemunhal quando não houver possibilidade de perícia.
II-
Abuso
de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza:
· Abuso de Confiança: é
a decorrente de certas relações (emprego, amizade ou parentesco) estabelecidas
entre o agente e a vítima. O agente aproveita-se da confiança nele depositada
para praticar o furto, pois há menos vigilância do proprietário sobre seus
bens. No caso de empregado, não basta esta relação, havendo necessidade de
vínculo de lealdade e menor vigilância.
· Fraude: é
o ardil, artifício, meio enganoso que o agente usa para diminuir ou iludir a
vigilância da vítima e subtrair o bem. Exs: agente disfarçado de carteiro,
empregado de telefônica que entra na residência para furtar; agente que, fingindo
fazer compras, distrai a vendedora e subtrai objetos. Etc.. Há necessidade do
não consentimento da vítima.
· Escalada:
é o acesso a um lugar, residência ou via anormal: escada, corda, saltar um muro
alto, retirar telhas, fazer túnel, etc.. Não há obrigatoriedade da perícia,
pois nem sempre a escalada deixa vestígios.
· Destreza: é
a habilidade física ou manual do agente que lhe permite o apoderamento do bem
sem que a vítima perceba (“punga”): subtrair carteiras, dinheiro do bolso ou da
bolsa, colar... Se a vítima perceber, será furto simples tentado. Se terceiros
perceberem, será furto qualificado tentado. Se a vítima estiver embriagada,
dormindo ou inconsciência, não há que se falar em destreza.
III) Com emprego de chave falsa: é
a chave imitada da verdadeira; a chave diversa da verdadeira, mas alterada de
modo a poder abrir a fechadura; a gazua, ou seja, qualquer dispositivo (gancho,
chave de feito especial) usado para abertura de qualquer espécie de fechadura.
Se a chave for verdadeira, mas obtida mediante fraude, o furto será simples.
Furto mediante “mixa” é qualificado (STF, HC 106.095/RS/2011).
MIXAS
IV) Mediante
concurso de duas ou mais pessoas:
· 1ª corrente: há necessidade de todos os
agentes participarem dos atos executórios para qualificar o furto (DELMANTO,
STJ);
· 2ª corrente: ainda que os agentes não
realizem os atos executórios e não estejam no local do crime (mandante) –
(JESUS, MIRABETE).
· OBS: Não importa que os
agentes sejam inimputáveis (menor) ou que não possam identificados.
· OBS: Súmula 442 STJ: não se
aplica ao furto qualificado pelo concurso de pessoas a majorante do roubo.
· OBS: Furto qualificado pelo concurso de agentes V.S Quadrilha: O
entendimento majoritário é de que é possível cumular, em concurso material os
dois crimes (furto qualificado + quadrilha), pois os bens jurídicos tutelados
são diferentes: quadrilha – perigo que a associação traz para a coletividade e
qualificadora do concurso de pessoas – facilidade para subtrair. Há decisões
contrárias: STF, HC 65.717/SP/1988.
V)
Transporte de veículo para outro estado ou país (art. 155, § 5º CP): aplica-se
ao furto de qualquer veículo automotor: carro, moto, navio, van, caminhão,
trator, ônibus, aeronave, lancha, etc.. Só não incide quando se tratar de
transporte de algumas peças.
Requisitos:
· Intenção
de transportar o veículo no momento da subtração;
· Efetiva
transposição da fronteira do Estado ou país, mesmo que em momento posterior à
subtração;
· A
tentativa nessa qualificadora só ocorre se, o agente, estando próximo da
divisa, furta um veículo e for imediatamente perseguido e cruze o marco
divisório, sendo preso, pois não obteve a posse tranquila;
· As
demais qualificadoras só se aplicam como circunstanciais do art. 59 CP,
prevalecendo a do § 5º, 155, CP.
L) Ação Penal:
Pública Incondicionada.